Empresas e residência de Regalmuto em São Paulo

Águas Yara – A “Deusa das Águas”

(Sexta parte)

*Walter de Oliveira

Com o bom desempenho das vendas da água mineral e o perfeito funcionamento do seu complexo termal (hotel e piscina), Domingos Regalmuto passou a dedicar-se exclusivamente ao projeto que ele próprio considerava ser “a joia da coroa” de todos os seus empreendimentos: a “Cidade Yara”. Nada menos que 92 alqueires de terra, ou seja, 2.326.400 m2 foram destinados à implantação da cidade que ele idealizou para implantar, segundo suas próprias palavras, “no coração da região mais rico do Brasil, o Norte do Paraná”, mais precisamente no município de Bandeirantes.

Seria a primeira cidade balneário do estado e com o singular destaque de ter uma água semelhante à da famosa fonte de Karlsbad, na antiga Tchecoslováquia, hoje Repúblicas Tcheca e Eslováquia. Foi no dia 23 de junho de 1950, quando o doutor Thomas Marki, advogado paulista e chefe do departamento jurídico do conglomerado de “seo” Domingos, apresentou o pedido de registro do loteamento urbano “Cidade Yara” ao Cartório do Registro de Imóveis da comarca. O loteamento composto por algumas centenas de datas de terras, avenidas, ruas, praças e logradouros públicos foi registrado no Livro Auxiliar nº 8, do referido cartório e que ainda permanece à disposição para consulta pública.

À esq., Paulo Domingos Regalmuto e sua esposa Beatriz. À dir.

Cumpridas tais formalidade legais, coube ao departamento de marketing e vendas da Planurba S.A. produzir e imprimir os respectivos folhetos e cartazes de propaganda e lançar o projeto no mercado, o que ocorreu a seguir e com tal êxito de vendas, ao ponto de um ano do seu lançamento estarem vendidas nada menos que 660 datas de terras. Ditas vendas feitas à prestação, foram todas elas levadas à inscrição e averbação à margem do registro do loteamento, para que, se alguém tiver curiosidade de saber quem foram as pessoas que compraram datas de terras na “Cidade Yara”, basta solicitar informações ao Cartório do Registro de Imóveis da comarca. Dentre outros cidadãos, os compradores foram pessoas residentes em São Paulo, Jaú, Bauru, Ponta Grossa, Maringá, Londrina, Cornélio Procópio e várias outras cidades paranaenses.

Para que o leitor tenha uma ideia do tamanho da projetada cidade, a bela e de quase todos conhecida “Capela São Domingos” – de arquitetura italiana e construída por Regalmuto nos idos de 1954, hoje sob a jurisdição episcopal da Mitra Diocesana de Jacarezinho – está dentro da área da cidade, área na qual “seo” Domingos construiu à época, nas suas partes mais elevadas, vários reservatórios de concreto, em formato arredondado, com capacidade para 90 mil litros cada (destinados ao abastecimento das futuras casas), subsistindo ainda hoje dois deles, um dos quais abastece a residência dos atuais proprietários de parte do que foi a “Águas Yara”.

À esta altura do presente relato, o leitor estará se perguntando: se foram vendidas naqueles idos a fabulosa soma de 660 datas de terras da então apenas projetada, mas tão decantada cidade balneária, o que foi feito dela, ou quais os motivos dela não haver “saído do papel”? A resposta a tal e mais que justa pergunta pode ser resumida na singular e resumida frase de conhecido dito popular: “às vezes o homem põe e Deus dispõe”. Quis o destino, por crueldade ou capricho, que a esse tempo, Domingos Regalmuto fosse acometido de grave e implacável trombose, que debalde os mais especializados e avançados tratamentos médicos, custou-lhe a amputação de ambas as pernas, uma tragédia, sobretudo para alguém do ânimo e dinamismo de Paulo Domingos Regalmuto Coffa. O resultado foi o seu imperioso e imediato afastamento do comando das suas atividades, que muito se ressentiram disso, não obstante a eficiência funcional de Guilherme e Waldemar Sachs na gestão dos negócios no município (serraria, posto de combustível, complexo hidrotermal e a Fazenda São Domingos). Filho, “seo” Domingos teve apenas um, Paulo Regalmuto Filho, por cuja mãe, uma bela e culta jovem húngara, Catherine Erdeli, ele se apaixonou já depois de cinquentão e com quem veio a casar-se após o falecimento da primeira esposa Beatriz.

Mesmo ante a uma tal e difícil situação, Regalmuto ainda procurou tirar forças da fraqueza e continuar a comandar seus negócios, mas terminou por se render à realidade. O parque fabril paulistano não representava problema, eis que estava sob a gestão do competente Pedro João Cossato. A dificuldade que o atormentava residia nos seus negócios em Bandeirantes. O filho ainda pré-adolescente estava entregue aos cuidados da zelosa mãe, que se desdobrava em prepará-lo para os grandes desafios que lhe esperavam: chegado à idade adulta, substituir o pai no comando de tudo aquilo que ele construíra. Foi então que Domingos Regalmuto tomou uma decisão e da qual mais tarde se arrependeria: dar em “arrendamento” não só o complexo hidrotermal, como também a Cerâmica São Domingos, excluindo do plano a parte agrícola da fazenda, até ali e por vários anos administrada por José Negrisoli, sucedido anos depois por José de Souza, também conhecido por José de Paula.

No dia seguinte ao anúncio de que a “Águas Yara” era objeto de arrendamento, o alemão Rudolf Mueller (gerente do hotel) recepcionou Jacob Elias Issa, do círculo de negócios de Londrina, então chamada de “Capital Mundial do Café”, que se apresentou como interessado no arrendamento. Homem de conversa direta e sucinta e fazendo-se acompanhar de seu assessor jurídico Elias Issa, causou a melhor das impressões em Regalmuto, que mandando vir de São Paulo o seu já referido mentor jurídico, doutor Thomas Marki, que aqui chegando fez todas as verificações a respeito do londrinense, que dali a uma semana e por vários anos foi quem comandou o encantado mundo criado pela audácia (e recursos) de Domingos Regalmuto. Enquanto “Águas Yara” ia a todo vapor sob a regência de Jacob Elias Issa, a “joia da coroa” dos empreendimentos de Regalmuto, a “Cidade Yara”, foi, dia a dia, perdendo o entusiasmo e impulso iniciais, mercê de motivos que serão referidos na próxima publicação.

(fotos cedidas por João Carlos Gerin, sobrinho-neto de Regalmuto).

(Continua na próxima edição)

* Walter de Oliveira, 89, articulista desta Folha, é bandeirantense, nascido em 1932.

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