Walter de Oliveira*
QUINQUAGÉSIMA SEXTA PARTE
Mais uma quarta-feira, quando temos o grato prazer de reencontrar os nossos milhares de leitores, o que, além de nos dar muita alegria, renova as energias de que tanto carecemos para vencer as etapas que nos separam do ponto final deste trabalho do resgate da história de Bandeirantes. Uma história que começou a ser escrita com a chegada do engenheiro civil Carlos Borromei, que abriu, em 1901, a primeira clareira nas matas que cobriam esta região e nela ergueu seu acampamento de trabalho de divisão da posse Fazenda Laranjinha (50 mil alqueires de mata virgem).
Ao depois, continuaram a escrevê-la Eugênio Macaco, João Cravo, João Manoel dos Santos e outros, quando, em 1930, com a chegada da linha férrea, surgiram outras mãos para ajudar. Hoje, amanhã e depois, novos atores entrarão em cena, de vez que ela continuará a ser escrita.
Dito isto, voltamos ao registro dos pioneiros do “Povoado da Estação”, quando estamos na listagem dos “vendedores de bilhetes de loteria”, e o nosso pioneiro é Francisco Manoel dos Santos, mais conhecido por Duque, por motivos já explicados. Essa atividade Duque a exerceu até o ano de 1949, quando o município de Bandeirantes foi elevado à categoria de comarca.
Os preparativos para a instalação da comarca, levaram o seu primeiro juiz, Augusto César Viana Espínola à formação do seu “quadro de auxiliares”, dentre os quais, embora interinamente, sua excelência escolheu e nomeou Duque para o cargo de distribuidor, contador, avaliador judicial e depositário público, no qual ele depois foi efetivado e o exerceu até 1962, quando foi removido para a comarca de Curitiba, para onde se mudou e ali terminou os seus dias. Ainda sobre esse pioneiro, lembrou-nos o caro amigo Maurício Zulmires (lá de Araraquara/SP), que em razão de problemas com a saúde, Duque extraíra um dos pulmões, mas ainda assim era pessoa bastante ativa.
b) José Félix Maximiano. Deste pioneiro, apenas o seu nome ficará em nossa história, eis que, apesar do nosso empenho e das buscas feitas pelo registrador Silmar Cordeiro de Souza, nada mais obtivemos a respeito.
c) Joaquim dos Santos. Ao contrário do pioneiro anterior, muito temos a dizer do pioneiro “Joaquim Bilheteiro”, como era ele conhecido. Figura alegre e cativante, Joaquim dos Santos fez-se um ser dos mais populares no “Povoado da Estação”, no qual antes de ser bilheteiro, foi dono de bar (em local que se ignora), onde servia uma bacalhoada de dar água na boca, segundo nos informou em carta enviada em setembro de 2014 (para se ver desde quando estamos em trabalho de pesquisa), a sua filha Elvira Santos Moreira. Todavia, e por problemas com a saúde da esposa (que viria a falecer), o pioneiro Joaquim vendeu o seu bar e passou à profissão na qual trabalharia durante o restante de sua vida útil (no sentido de trabalho).
Perdoem-nos nossos leitores, mas dados julgados importantes para a história nos obrigam a ceder mais tempo e espaço ao bilheteiro Joaquim dos Santos. Por exemplo, a sua esposa, Elvira, foi a primeira agente dos correios do povoado, e era filha de Elísio Manoel dos Santos e Maria Jovelina dos Santos (primeira professora do povoado da Invernada – a primeira professora de Bandeirantes foi Ismênia Loretti Nogueira, esposa de Osório Nogueira).
Vemos pela relação familiar, que Joaquim era sobrinho do pioneiro Duque, que por sua vez era irmão de Elísio Manoel, o qual, com o falecimento da filha Elvira, tomou para si, a esposa e os filhos que com ela moravam, o encargo da criação dos netos (3 meninas e 1 menino). O filho varão, Joaquim dos Santos Filho (conhecido pelo apelido de Mano pelas gerações da época), assim como as filhas Teresa e Elvira, estudaram nos colégios Cristo Rei e Imaculada Conceição, de Jacarezinho, em sistema de internato, o que dá notícia da boa situação financeira do avô Manoel Elísio. Joaquim dos Santos Filho, através de Benedito Moreira (político de longo histórico no norte pioneiro), entrou na carreira política, logrando eleger-se por 3 vezes deputado federal, quando assumiu o nome Santos Filho, que certamente soava melhor no plenário da câmara alta; Santos Filho foi também diretor de operações da Caixa Econômica Federal e a nível de política estadual, ele foi chefe da Casa Civil no governo de Paulo Pimentel.
O bilheteiro Joaquim dos Santos pôde ver grande parte do sucesso do seu filho, o que compensou as dificuldades e agruras que teve de enfrentar. Diferente de seu tio Duque, ele era homem de hábitos comuns, trajando comumente uma calça de brim, camisa de mangas curtas (e de dois grandes bolsos ao peito, onde carregava os bilhetes à venda), chapéu de fibra ou palhinha e nos pés, um par de sapatões de vaqueta. Homem bastante obeso, era de “pouco caminhar”, não lhe sendo isso um estorvo na profissão, e enquanto os seus dois referidos concorrentes iam à caça de clientes, os de Joaquim dos Santos sabiam onde encontrá-lo; ele tinha “mesa cativa” no bar ao lado da Casa Arai, uma espécie de “seu escritório”, onde atendia a grande e fiel clientela, e isso porque além da sua já prosaica simpatia, diziam que ele tinha os bilhetes com os números da sorte.
Depois desse tempo, vieram os “chalés” (que além de fazerem o “jogo do bicho”, também vendiam bilhetes).
Já fora dos anos desse pioneirismo, tivemos outros bilheteiros, dentre os quais nos lembramos do “seo” Merlin (já bastante idoso), pai do corretor Gilberto Merlin, e o último, que embora não sendo pioneiro, fez a vida vendendo bilhetes de loteria; o “Mazzaropi” (cujo verdadeiro nome era DeCarlo Suemitsu). Sendo portador de dificuldades de coordenação motora e de expressão, Mazzaropi marcou época, como poucos, nessa atividade. Pelo que pudemos apurar, ele está sob cuidados no Asilo São Vicente de Paulo, na cidade de Itambaracá/PR. Em nosso livro daremos o destaque que lhe é devido.
Continua.
* Walter de Oliveira, 92, articulista desta Folha, é bandeirantense, nascido em 1932.