Miguel é um pai amoroso, bastante ocupado e sempre achou que dava atenção para o filho João, porque sempre perguntava a ele se estava tudo bem.
Um dia, viajando com a esposa, recebeu uma mensagem do filho, dizendo apenas: “Eu amo você. Adeus”. Horas depois, a avó o encontrou sem vida.

Maria é pediatra e mãe de 2 filhas, uma delas, estudante morando em outra cidade.
Num fim de semana em que Maria estava visitando a filha, a menina pulou da janela do apartamento em que morava.

Essas duas histórias bem que poderiam ser cenas de um filme de horror de quinta categoria. Mas são histórias da vida real. E quando chega o mês de setembro, o assunto suicídio vem à minha mente, justamente por ser o mês escolhido para a campanha de prevenção ao suicídio.
É um assunto pesado, eu sei, mas precisamos falar sobre isso.

Vocês já leram a matéria que a psicopedagoga Cassiana Tardivo escreveu, chamada “Os filhos do quarto”? Ela começa dizendo que antigamente nós perdíamos nossos filhos nos rios, nos mares, no mato e hoje, nós os perdemos dentro do quarto.
Se antes nós não tínhamos uma TV em cada quarto e nem aparelhos eletrônicos à mão, hoje, essas facilidades tecnológicas acabaram aprisionando nossos filhos dentro do quarto. E eles ficam lá, com fones de ouvido, trancados em seus mundos.
Nós não ouvimos as risadas deles, não sabemos o que pensam, quais o sonhos deles, mas fingimos acreditar que está tudo bem com eles por estarem dentro de casa.
Não, não está tudo bem!
Basta ver o índice de suicídio entre jovens: segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria, 7,3% das mortes dos jovens tem relação direta com o suicídio. O suicídio é a segunda causa de morte entre adolescentes e jovens.

Estamos perdendo a conexão com as pessoas, e isso está acontecendo não somente com os jovens. E não é devido à pandemia. Isso já vem acontecendo há muito tempo.
Parece que estamos com preguiça de estabelecer relações sólidas com as pessoas, porque dá trabalho, exige um esforço, gasto de energia.
Então, as coisas ficam na superficialidade. Desta forma, não incomodamos ninguém e também não somos incomodados. Ledo engano!

Uma pesquisa feita em Harvard já comprovou que as pessoas mais felizes são as que tem bons relacionamentos. E parece-me que as pessoas estão mais solitárias do que nunca.
Uma coisa que me deixa triste é quando vou a um restaurante e vejo pessoas sentadas à mesma mesa, cada qual interagindo com o próprio celular, somente de corpo presente. E se é um casal, pior ainda.
Qual a mensagem que estamos passando quando saímos com alguém e não desgrudamos do celular?
“Você não é importante”, “Você é invisível para mim”!
Essa fragilidade em estabelecer conexões fortes, baseadas em conversas olhando nos olhos, risadas, trocas de ideias, tem contribuído enormemente para que muitas pessoas sintam solidão, ainda que rodeadas de pessoas. E a solidão abrevia em 15 % a expectativa de vida.

Falta atenção e falta principalmente saber ouvir.
Vocês já tiveram uma conversa com alguém em que a pessoa gostou muito de falar com você, quando na verdade você somente a ouviu?
Todos nós queremos ser ouvidos, sem julgamentos. A isso chamamos de escuta ativa. Está faltando empatia.
É por isso que é importante conversar com os nossos filhos, saber o que pensam, o que sentem. E mais importante que isso, dizer o que pensamos, como nos sentimos, para que eles não criem a falsa ideia de que somos fortes o tempo todo. Não, nós não somos fortes o tempo todo e não devemos mostrar que somos, sob o risco de os nossos filhos terem medo de falar sobre as fragilidades deles, achando que vão nos decepcionar, diante da nossa falsa perfeição.

O que eu mais ouço dos jovens é: “Eu tenho medo de decepcionar meus pais”. Estamos empobrecidos na comunicação efetiva, em nos conectarmos com as pessoas, ter empatia, tentar entende-las. Isso leva muitas pessoas a achar que estão sozinhas e não tem quem as apoie em seus problemas, que não há uma “luz no fim do túnel”.
Precisamos cuidar melhor uns dos outros porque nós somos responsáveis sim, mesmo indiretamente, pelo que acontece a quem está à nossa volta. E se você for a pessoa que não vê uma luz no fim do túnel, e acha que não tem com quem conversar, ligue para 188, o número do CVV, Centro de Valorização da Vida. Haverá sempre alguém disposto a ouvi-lo, 24 horas por dia.
“Pessoas precisam de pessoas”.

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