Paulo Regalmuto Filho, o “Paulinho” e Albany, no Jaguar em que ele participava das corridas em Interlagos (foto cedida por Rafaela Martins – Fazenda Yara).

Águas Yara – A “Deusa Das Águas”

(Nona Parte)

Walter de Oliveira*

Neste relato em que contamos a história da primeira estância hidromineral da nossa região, paramos no último artigo sobre o impacto da morte do seu fundador, Paulo Domingos Regalmuto Coffa, um nome de alta relevância nos primórdios da história do município, que, na contramão, sequer o homenageou pondo o seu nome em uma via pública, praça ou no próprio aeroporto municipal, cujo terreno em que está situado foi ele quem doou. À sua lamentável ausência, seu filho unigênito e também Paulo Domingos, mesmo sob o efeito psicológico da dolorosa perda assumiu a supervisão das empresas que o pai lhe deixara, cada uma sobre os cuidados de administradores também do tempo do seu genitor. Em uma época de dificuldades várias, sobretudo no tocante às estradas e meios de comunicação (onde telefone celular era coisa de ficção científica), Domingos Regalmuto Filho dividia o seu tempo – sempre na companhia da esposa Albany – entre São Paulo e Bandeirantes.

Ao centro, Guilherme Sachs; à sua esquerda a esposa Ancila e a filha Irma; à sua direita, Rudolf Müller, a esposa Arminda e a filha Renata (Foto cedida por Renata).

A essa altura dos acontecimentos, o autor, que já tinha alguma ligação com o grupo, eis que ao seu tempo de escrevente de cartório prestava serviços a Domingos Regalmuto (pai), mais se aproximou do seu herdeiro ao ser nomeado avaliador “ad hoc” dos seus bens aqui situados e arrolados no inventário de Beatriz Brassi Regalmuto, primeira esposa de seo Domingos. A partir daí – como os leitores poderão ver – e por conta da sua função de avaliador e também por ter sido nomeado oficial do Cartório de Registro de Imóveis da comarca, essa ligação mais se estreitou, como também mais aumentou a sua atuação em muito do que viria acontecer no contexto envolvendo “Águas Yara”.

Mal acabara o autor de avaliar os bens arrolados no inventário de dona Beatriz, o mesmo ocorreu em relação ao inventário de Domingos Regalmuto. Enquanto tudo isso acontecia, o tempo passou e estávamos já no final de 1963 quando então, e mais precisamente na noite de 6 de dezembro daquele ano, a população de Bandeirantes foi surpreendida com uma notícia quase surreal e que mudou – e poder-se-ia dizer, que selou – o destino de “Águas Yara”. Naquele dia completavam-se duas semanas em que, ao contrário de sempre, Paulinho e Albany não estavam juntos, eis que enquanto ele dividia o seu dia a dia entre serraria, fazenda e complexo termal, Albany passava seus dias com familiares em São Paulo. Nesse preciso dia Paulinho fora atender compromissos em Londrina e à noite, de retorno à residência (a pouca distância do hotel e a mesma em que residem os atuais donos de “Águas Yara”), como de hábito, passou no hotel para fazer um lanche e se inteirar de algum recado e coisas assim, quando o alemão Rudolf Müller, amigo e gerente do seu hotel lhe participou que Albany ligara de São Paulo e pedia retorno. Contava Müller, que ele (gerente) fez a ligação e Paulinho falou por algum tempo com a esposa, desligou, deu algumas instruções a Rudolf, pegou algum dinheiro no cofre do hotel, se despediu dele e dos funcionários presentes e disse que estava saindo para São Paulo ao encontro da esposa. Um encontro que não aconteceu.

Jovem e dono de um pulsante vigor físico, assim que ganhou a BR-369, Paulinho, com a voz da esposa ainda ecoando em seus ouvidos, pisou fundo no acelerador do seu fusca rebaixado, com motor Porsche, que em minutos parecia voar no asfalto. Acostumado às altas velocidades que esportivamente imprimia ao seu Jaguar nas pistas de Interlagos, ele estava “se achando em casa”, quando, vencidos os primeiros 35 km da viagem, ao fazer uma até discreta curva à direita, o destino lhe disse “stop “. Ele nem percebeu o choque que arrancou o rodado traseiro de um caminhão vindo em sentido contrário. O final da projetada viagem não foi na rua Domingos de Moraes, Vila Mariana, em São Paulo. Foi no Km 20 da BR-369, trecho urbano de Cambará, onde hoje se situa o Restaurante Alaska e a estação rodoviária. Nesse dia Paulinho encerrou o reinado de apenas dois anos e 37 dias sobre o pequeno império econômico-financeiro erigido por seu pai e dele herdado, cujo clima nele dominante, a partir dali, era de caos e desalento.

Abriu-se então o terceiro inventário envolvendo os bens de Domingos Regalmuto e no qual o autor também atuou como avaliador judicial “ad-hoc” dos bens aqui localizados, os quais, por acordo amigável entre Albany (viúva-meeira) e dona Chatherine, ficaram para esta, como mãe e herdeira ascendente do filho (Paulinho não deixou descendentes). Com a morte do filho – única razão da sua existência, como ela costumava dizer – dona Chatherine deixou o patrimônio herdado aos cuidados de Pedro João Crosato, o que foi, porém, por um curto espaço de tempo, eis que este também logo faleceu ao passar por cirurgia na capital paulista. Desolada também por esse fato, pois Crosato, além de ser o seu famoso “faz-tudo”, era pessoa por quem ela tinha grande estima, dona Chatherine decidiu vender todos os bens que herdara, sendo que a última venda foi feita ao procopense Pascoal D’Andrea, que a partir de 1963, passou a ser o novo dono da Fazenda São Domingos e de Termas Yara.

Conceituado comerciante do ramo imobiliário, D’Andrea “loteou” grande parte da fazenda, revendendo-a a pequenos sitiantes e reservou para si a área de 92 alqueires onde se situava o complexo termal e também se praticava a exploração agrícola. Sobre a posse e direção de D’Andrea e seus filhos, Júlio César e Márcio Antônio, “Águas Yara” inaugurou um novo tempo. Tempo no qual o autor teve bastante participação, como os leitores verão a partir do próximo capítulo.

PS: Em nosso último artigo, ao legendar a foto do gerente do Hotel Yara, Rudolf Müller, o autor nominou como Regina a filhinha que o acompanha. A informação, equivocadamente registrada, é então aqui revisada: a filha de Rudolf que aparece na foto é RENATA, irmã de Regina. Dita correção é feita graças à observação da própria Renata, que entrou em contato com o autor para agradecer às lembranças do pai, evocadas no relato e a quem o autor agradece pela gentileza da cessão de fotos e das muitas outras e úteis informações históricas por ela fornecidas.

 (Continua na próxima edição)

* Walter de Oliveira, 89, articulista desta Folha, é bandeirantense, nascido em 1932.

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