Vista da piscina da Yara à época em que Paschoal D’Andrea iniciou as reformas no complexo termal (foto cedida por Márcio D'Andrea).

Águas Yara – A “Deusa Das Águas”

(Décima parte)

*Walter de Oliveira

A Era de Paschoal D’Andrea – Primeira Parte

Um “gentleman”, era o que se podia dizer para definir Paschoal D’Andrea, que foi dono de Termas Yara de 1963 a 1980, um período de raro brilho vivido pela “Deusa das Águas”. Estávamos então no nosso segundo ano como Oficial do Cartório de Registro de Imóveis da comarca, quando D’Andrea chegou na serventia e apresentou para registrar o contrato particular pelo qual dona Chaterine Ederly Regalmuto se comprometia a lhe vender o remanescente da Fazenda São Domingos (algo em torno de quatrocentos alqueires de terras), nele incluso o complexo hidrotermal, assim compreendido o conjunto piscina-hotel, posto que o setor de engarrafamento e venda da “Água Yara” fora desativado quando terminou o seu arrendamento para Jacob Elias Issa.

Por dever funcional nos inteiramos do teor do contrato, quando um detalhe nos chamou a atenção: D’Andrea estava comprando todo aquele imenso patrimônio, investindo de “capital próprio” pouco mais de 1% (um por cento) do valor dos bens objetos do negócio, um fato, convenhamos, raríssimo, comercialmente falando. Para um melhor entendimento do que dizemos, os bens envolvidos na transação foram avaliados em CR$ 1.050.000.000,00 (um bilhão e cinquenta milhões de cruzeiros), padrão monetário então vigente e Paschoal D’Andrea deu de entrada à dona Chaterine o valor de CR$ 15.000.000,00 (quinze milhões de cruzeiros). Em uma época em que o dinheiro estava difícil, a venda da Yara só se viabilizou pela visão e argúcia do experiente operador no mercado imobiliário que era D’Andrea, sendo que o negócio foi bom para dona Chaterine, que alcançou um justo preço pela venda da sua propriedade e excelente para D’Andrea, que reconhecia ter sido a compra da Yara um dos melhores negócios da sua vida.

Vista frontal do hotel e da lanchonete, à época já muito bem frequentada (foto cedida por Márcio D’Andrea).

E foi, pois com efeito e repetindo as palavras suas, “não é sempre que se compra uma galinha para pagar com os seus próprios ovos”. Juntando experiência e perspicácia, D’Andrea viu logo que, excluindo os 92 alqueires destinados à malograda “Cidade Yara”, mas ainda “gravados” com as 660 averbações de datas vendidas, “lotear” e vender o remanescente de aproximadamente 300 alqueires da Fazenda São Domingos, seria uma iniciativa de fácil realização, de alta lucratividade e que ele faria num “zás-traz” de tempo. E foi assim, jogo franco. D’Andrea apresentou o plano a dona Chaterine, que o submeteu à análise da sua assessoria, que após achá-lo viável, checou as referências do comprador e o negócio foi fechado.
Já na semana seguinte ao negócio, Narciso Ferreira (pai do Sidney da Yara), agrimensor de D’Andrea, fazia o levantamento topográfico da área, que loteada e posta à venda, em poucos meses já era de dezenas e dezenas de novos donos. À medida que D’Andrea vendia, o dinheiro das vendas era repassado a dona Chaterine, obedecendo o estipulado no contrato, restando desse “círculo virtuoso”, que em menos de dois anos ela já estava com o valor da venda da Yara na sua conta bancária e D’Andrea e os filhos Júlio César e Márcio Antônio se ocupavam de ir tocando o complexo hidrotermal.

Todavia, ainda uma coisa preocupava o novo dono de Termas Yara, que não sabia, de fato, qual era sua “relação de dono” quanto aos 92 alqueires ocupados pelo projeto “Cidade Yara”, ainda em vigor perante os registros públicos, eis que, como referido, 660 vendas de datas continuavam averbadas no Cartório de Registro de Imóveis. De novo D’Andrea nos procurou para saber o que fazer, quando o informamos que, segundo a lei pertinente, ele devia “notificar” por carta, com “A.R.” (Aviso de Recebimento), a todos os compradores de datas, cujos endereços constavam dos assentos existentes no escritório de Termas Yara. Expedidas as 660 cartas, como já era esperado, à exceção de cinco ou seis compradores que se manifestaram e venderam a D’Andrea as datas que haviam adquirido no projeto, ninguém mais demonstrou se interessar pelo assunto, criando uma situação jurídica que permitiu o cancelamento das averbações existentes, confirmando D’Andrea como legítimo dono também dos ditos 92 alqueires de terras, já usados como pastagens e agricultura.

Simultaneamente a isso tudo, equipes especializadas contratadas por D’Andrea, procediam ampla reforma no complexo termal. Enquanto uma equipe acabava a construção do local destinado à recepção do hotel, bar e lanchonete, outra procedia a reforma dos 200 apartamentos e do salão nobre e uma terceira se ocupava do reforço da fundação e da estrutura daquela enorme construção. Uma das reformas que mais tomou tempo de D’Andrea foi o “cassino”, o primeiro espaço a ser concluído e posto em funcionamento, embora clandestinamente. As sessões de apostas começavam nas tardes das terças, quartas e sextas-feiras e se prolongavam nos sábados e domingos, a elas comparecendo apostadores locais e das cidades próximas como Cambará, Jacarezinho, Ribeirão do Pinhal e Cornélio Procópio e também das mais distantes, como Londrina, Maringá, Curitiba, Bauru e outras. As apostas, geralmente altas, eram à vista e não raro com grandes perdas, como o caso mais célebre de um pecuarista da região de Londrina, que num único tríduo de sexta-feira-sábado-domingo, perdeu nada menos que CR$ 1.300.000,00 (um milhão e trezentos mil cruzeiros), moeda então vigente. Como à época disse o próprio e desventurado apostador: – Lá se vão algumas jamantas de bois. Além do esmerado e atencioso atendimento, o hotel oferecia aos apostadores, como cortesia da casa, apartamentos, bebidas e refeições, estas obviamente que também à noite e madrugada e no próprio e luxuoso espaço destinado ao cassino.
(Continua na próxima edição)

  • Walter de Oliveira, 89, articulista desta Folha, é bandeirantense, nascido em 1932.

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