Invernada, o Berço de Bandeirantes

(Conclusão)

* Por Walter de Oliveira

Este artigo, último de uma série de três sobre a história da Invernada, retoma o tema com a chegada ao povoado de uma nova personagem, cujo nome, já foi citado no artigo passado, e que foi de suma importância para o núcleo-embrião do nosso município.

Contava João Cravo, que já era fim de tarde de um dos últimos dias de janeiro de 1927, quando um homem parou seu bem arreado cavalo em frente o seu armazém-hotel, dele apeou e amarrou-o numa trave própria para isso. De meia idade, o recém-chegado, que trajava um bem cortado terno de brim cáqui, calçava lustrosas botas de vaqueta e usava chapéu de feltro de boa marca, que tirou da cabeça ao adentrar o recinto, cumprimentando-o cortesmente. A saudação foi respondida de igual forma, enquanto Cravo, mais por precaução que por hábito, analisava, em cada detalhe, o elegante forasteiro (tipo de pessoa totalmente incomum na região) e, como todo bom lusitano, indagava consigo mesmo: quem será esse “gajo”? E o homem – concluiu Cravo, após sorver mais um gole da sua cerveja preferida – era João Manoel dos Santos, de quem em pouco tempo se tornaria amigo.

Dizendo que pretendia ficar alguns dias no povoado, João Manoel tomou um quarto na estalagem, pediu ao cavalariço da casa que tomasse conta do seu cavalo e foi refazer-se da cavalgada de 38 quilômetros (Cambará – Invernada) que acabara de fazer. Na manhã seguinte, ao terminar seu café, aproximou-se de João Cravo e disse-lhe que gostaria de falar-lhe, acrescentando que a conversa seria do seu interesse. Cravo respondeu afirmativamente e convidou-o a se sentar numa cadeira em frente. Homem prático e experiente em bem se comunicar, João Manuel lhe mostrou um documento cuja capa indicava tratar-se de uma escritura feita em cartório, contando-lhe então da compra de dez alqueires de terra que fizera à Dona Josephina Alves de Lima, exatamente a área sobre a qual estava o povoado da Invernada, conforme já narrado no artigo anterior, e que portanto, a partir daquela data, era ele, João Manoel, o dono das terras sobre as quais todos os moradores da Invernada construíram as suas casas e estabelecimentos comerciais, e como tal, apenas ele podia lhes dar as escrituras daquelas propriedades. João Cravo, uma dessas “pessoas”, e que o ouvia atentamente, ficou gratamente surpreso quando João Manoel lhe mostrou a cláusula da escritura, pela qual ele, Cravo, receberia a sua escritura sem nenhum custo para si. A partir dali, Cravo já via em João Manoel dos Santos um homem de negócios, inteligente o suficiente para, ao mesmo tempo em que iria resolver um antigo problema daqueles moradores, estaria também, num curto período de tempo, obtendo um excelente lucro financeiro, ao ponto dele confessar, tempos depois, que nos sessenta dias que ficou no hotel de João Cravo, acertando as escrituras com os moradores da Invernada, ganhou mais dinheiro do que nos seus últimos cinco anos de trabalho. Satisfeito pela solução de seu caso, João Cravo ajudou bastante nas negociações de João Manoel com os moradores da Invernada, que decorridos os ditos sessenta dias, voltou para Cambará de bolsos recheados e satisfeito por haver trazido tranquilidade aos moradores da Invernada, com a legalização de suas propriedades.

Estamos agora no princípio de 1928, quando, o povoado da Invernada foi elevado à categoria de Distrito Policial, com o nome de Bandeirantes, tendo João Fernandes Maciel (avô da professora da Uenp, Lilian Fernandes Maciel Ticianel) tomando posse como seu primeiro delegado de polícia. Em 12 de abril de 1929, o distrito foi elevado a Distrito Judiciário, cuja instalação se deu em 08 de dezembro do mesmo ano e Alcides Alvim Rezende nomeado como Juiz Distrital (o chamado “juiz de paz”). A essa altura, Bandeirantes (Invernada) já contava com cartório distrital (escrivão Joaquim Severo Batista Lisboa), correio (agente encarregado Alberto Faria Cardoso), consultório médico (dr. Gilberto Freire), farmácia (farmacêutico Ernesto Fischer), coletoria estadual (cujo nome do agente não se sabe), e grupo escolar (sendo sua primeira professora Maria Jovelina dos Santos). Em 1931, o distrito tinha a seguinte população: núcleo urbano, 1.200 habitantes, zona rural, 11.350 habitantes. Dos então habitantes do núcleo urbano, seguem-se os nomes conseguidos pelo autor: Eugênio Macaco (1910), João da Silva Cravo (1921), Alfredo Marcondes (1922), Estevão Leite de Negreiros (1927), Alcides Alvim Rezende, Asdrubal de Figueiredo Gizzi, Alberto Faria Cardoso, Ernesto Fischer, Gilberto Freire, João Fernandes Maciel, Elísio Manoel dos Santos, Joaquim Carvalho Torres, Pedro Bellan, Luiz Rabello, João Pedro, Kaito Ussuí, Sebastião Evangelista da Silva, Azarias Vieira de Rezende, Vito Bassani, Amiral Henriques, Manoel Leiroz, Avelino Lourenço, Joaquim Carreira, João Honório, Paschoal Altizani (avô do empresário José Roberto Altizani), João Afonso, cujo filho, Rubens Afonso, foi a quinta criança a ser registrada no cartório da Invernada e Sebastião Pinto de Toledo.

A primeira criança registrada na Invernada foi a menina Adelina, filha de João Félix da Costa Callado e Carmelita de Jesus, em 15/12/1929. O primeiro casamento foi de João Pires de Camargo e Maria Eugênia da Silva, em 05/01/1930.  Joaquim dos Santos Filho, registrado no distrito em 12 de fevereiro de 1933, foi o nosso conterrâneo daqueles idos, de maior posição nacional: chefe da Casa Civil no governo Paulo Pimentel, deputado federal e diretor de operações da Caixa Econômica Federal.

Aqui o autor encerra a síntese histórica da Invernada (núcleo urbano), um povoado surgido há mais de 100 anos no entorno de um acampamento abandonado, e em meio às dificuldades da época, cresceu e prosperou de forma surpreendente, até que a passagem de uma ferrovia pela região mudasse o rumo da sua história.

* Walter de Oliveira, 88, articulista desta Folha, nasceu em 1932, na Fazenda Pinto Lima. Serventuário da Justiça aposentado.

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